19 de março de 2012

O anatocismo da Tabela Price



Abaixo destaco um interassantíssimo estudo realizado pelo Desembargador Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no julgamento da Apelação Cível Nº 70004897351, apreciando uma ação revisional de juros e encargos contratuais em um contrato de financiamento imobiliário. Trata-se de um detalhado estudo acerca da Tabela Price que certamente esclarecerá muitas dúvidas de todos os leitores sobre o assunto.
Eis as palavras do ilustre Desembargador Adão Sérgio do Nascimento Cassiano:


4. Capitalização dos Juros
O contrato constante dos autos expressamente utiliza a Tabela Price como sistema de amortização, conforme se vê pelo item 2.2.3 do pacto (fl. 20). E também utiliza a taxa nominal de juros de 10,49% ao ano e a taxa efetiva de juros de 11% ao ano.
O réu sustenta que não há capitalização e que a Tabela Price não contém anatocismo. Todavia, como a seguir se demonstra, a capitalização dos juros é ínsita e imanente à fórmula da aludida Tabela. Aliás, quando se fala de taxa nominal de juros e de taxa efetiva de juros é porque se está sempre, nesses casos, diante de juros capitalizados, ainda que não fosse, na hipótese, aplicada a Tabela Price.
Pelo chamado “Sistema Francês de Amortização”, comumente denominado de Tabela Price, as prestações têm valor uniforme desde o início até o fim da contratualidade.
Nesse sistema, que é utilizado normalmente para financiamentos de longo prazo, como os habitacionais, cada prestação mensal é calculada de maneira que parte dela paga os juros e parte amortiza o saldo devedor do principal da dívida, de modo que ao ser paga a última prestação também estará quitado o saldo devedor que será igual a zero, ou próximo de zero em face de eventuais arredondamentos.
É do sistema da Tabela Price que, no início do período, os juros sejam a maior parte que compõe o valor da parcela e que a amortização seja a menor parte da mesma parcela, sendo que a situação tende a inverter-se quando se caminha para o final do prazo do contrato, quando então os juros serão a menor parte – como conseqüência da redução do saldo devedor sobre o qual são calculados mensalmente os juros – e a amortização a maior parte do valor total da prestação, restando o saldo zerado, como já referido, quando do pagamento da última prestação, somente sendo possíveis apenas pequenas diferenças devido a arredondamento.
Como os juros são calculados por ocasião de cada pagamento parcelado, e sempre incidentes sobre o saldo devedor e embutidos em cada prestação, então o novo saldo devedor, a cada período mensal, constitui-se como se fosse sempre uma reaplicação ou uma nova aplicação do saldo devedor – como se fosse um novo capital emprestado – por parte do credor em relação ao mutuário: é como se a cada parcela paga houvesse nova aplicação pelo valor do saldo devedor que irá render novos juros que serão embutidos na próxima prestação, e assim sucessivamente até o final do contrato.
O certo é que, em decorrência do sistema da Tabela Price, para que o saldo seja zerado na última prestação, cada parcela deve ser sempre maior que o valor do juro devido na mesma ocasião e incidente sobre o saldo devedor, pois, do contrário, a dívida se tornará perpétua ou vitalícia. O mesmo ocorre nos casos em que o saldo devedor é corrigido por determinado indexador e o valor da prestação por outro, o que faz criar um descompasso na parcela de amortização, de modo que, se os juros sobre o saldo não forem integralmente pagos na parcela mensal, o seu excedente se incorpora ao saldo devedor que serve de base para o cálculo de novos juros da prestação mensal seguinte, o que caracteriza a contagem de juros de juros ou anatocismo.
Seja como for, essa prática – de não pagar em cada parcela todo o juro que comporia cada prestação, ou de nada amortizar do saldo devedor em cada prestação – contraria frontalmente a lei que regula a espécie. E viola a lei porque esta determina que as prestações devem incluir obrigatoriamente parte de juros e parte de amortização da dívida. E isso porque, se não for assim, o sistema da Tabela Price estará desvirtuado totalmente. Logo, mesmo que seja adotado o sistema Price, a lei não admite o seu desvirtuamento especialmente para prejudicar o mutuário.
Vejam-se as disposições da Lei nº 4.380/64 – com base na qual foi firmado o contrato (art. 61, § 5º - fl. 19 dos autos) – que determinam que a prestação deve sempre ser composta de juros e de amortização e, em conseqüência, estabelecem o sistema de abatimento dos pagamentos feitos:
“Art. 5º Observado o disposto na presente Lei, os contratos de vendas ou construção de habitações para pagamento a prazo ou de empréstimos para aquisição ou construção de habitações poderão prever o reajustamento das prestações mensais de amortização e juros, com a conseqüente correção do valor monetário da dívida toda vez que o salário mínimo legal for alterado.
Art. 6º O disposto no artigo anterior somente se aplicará aos contratos de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão, ou empréstimos que satisfaçam às seguintes condições: (...)
c) ao menos parte do financiamento, ou do preço a ser pago, seja amortizado em prestações mensais sucessivas, de igual valor, antes do reajustamento, que incluam amortização e juros;
Art. 10.  Todas as aplicações do Sistema Financeiro da Habitação revestirão a forma de créditos reajustáveis de acordo com os artigos 5º e 6º desta Lei.
§ 1º - Os financiamentos para aquisição ou construção de habitações e as vendas a prazo de habitações, efetuadas pelas Caixas Econômicas ...(Vetado)... e outras autarquias ...(Vetado)... ou por sociedades de economia mista ...(Vetado)..., estabelecerão, obrigatoriamente, o reajustamento do saldo devedor e das prestações de amortização e juros, obedecidas as disposições dos artigos 5º e 6º.” (Os sublinhados foram acrescentados).
A Lei não determinou expressamente a aplicação da Tabela Price aos contratos. Entretanto, adotou essa sistemática de quitar, em cada prestação, os juros incidentes a cada período sobre o saldo devedor, e quitar ao mesmo tempo parte de amortização do financiamento. É certo que essa sistemática é própria da Tabela Price. Além disso, tal sistemática é da tradição da legislação brasileira, tanto que a Lei nº 8.692/93 adotou o mesmo conceito da Lei nº 4.380/64 ao dispor no parágrafo único do art. 2º o seguinte:
“Parágrafo único. Define-se como encargo mensal, para efeitos desta Lei, o total pago, mensalmente, pelo beneficiário de financiamento habitacional e compreendendo a parcela de amortização e juros, destinada ao resgate do financiamento concedido, acrescida de seguros estipulados em contrato.” (Sublinhado acrescentado).

Por isso não se alegue eventualmente que incide no caso a regra da imputação do pagamento prevista no art. 993 do CCB/16 e no art. 354 do CCB/2002. É que aqui se trata de regulamentação definida por lei especial em que não se aplica aquela disposição do Código Civil.
Assim, passo à análise da legalidade ou não da aplicação da Tabela Price, em função de que os autores se insurgem contra a capitalização dos juros, tema em relação ao qual o réu defendeu-se na contestação, especialmente em fl. 56 dos autos.
Na temática da Tabela Price seguir-se-á ao longo da fundamentação deste voto, a linha do estudo feito pelo eminente autor JOSÉ JORGE MESCHIATTI NOGUEIRA, no seu livro “Tabela Price – Da Prova Documental e Precisa Elucidação do seu Anatocismo”, Ed. Servanda, Campinas, 2002. E assim se o faz porque o estudo empreendido pelo referido autor partiu da consulta aos originais do livro de Richard Price sob o título “Observations on Reversionary Payments”, edições de 1783 e 1803, onde o religioso inglês desenvolveu as suas geniais Tabelas de Juro Composto.
Na verdade, o trabalho do inglês Richard Price, ministro presbiteriano, foi desenvolvido tendo em vista um sistema de pagamento para seguro de vida e aposentadorias, elaborado a pedido de sociedade seguradora, tendo Price construído tabelas que denominou de “Tables of Compound Interest” (Tabelas de Juro Composto). Sobre essa perspectiva histórica, da origem ou motivação do trabalho de Price, assim escreveu o autor citado (Mesquiatti Nogueira, José Jorge. Op. cit. pp. 37/38):
“O livro Observetions on Reversionary Payments, de autoria do Dr. Richard Price, demonstra, com as devidas explicações do próprio autor, a relação dos quatro Teoremas ali propostos, com a aplicação do juro composto (juro capitalizado, juro sobre juro ou ainda anatocismo) em seu sistema de pagamentos reversíveis e parcelados. É importante destacar que Price elaborou as suas tabelas de juro composto a pedido da Society for Equitable Assurance on Live (p. 174, vol. I, ed. 1803), com a finalidade de estabelecer um método de pagamento para seguro de vida e aposentadorias que acabou sendo usado por seguradoras do mundo todo até hoje. No caso do Brasil, sua maior utilização dá-se, até agora, na área de financiamentos de bens de consumo e do Sistema Financeiro da Habitação.
O livro ora referenciado e que apresentamos neste trabalho esclarece definitivamente pelos escritos do próprio autor que suas Tabelas, ou seja, as Tabelas de Price, tais como ele as denominou (Tables of Compound Interest), são de Juro composto. Destaco que somente no Brasil essas tabelas são conhecidas como Tabela Price, referenciando seu autor porque, se fossem conhecidas como o próprio autor as denominou, invariavelmente isso implicaria a informação de que são balizadas na capitalização de juro ...”. (Os destaques são do original).

No que importa ao âmbito deste processo, para demonstração da ilegalidade ou não da Tabela Price, faz-se a seguir um comparativo entre o cálculo de juros simples ou lineares e o cálculo dos juros pela já referida Tabela Price. Primeiro se faz um comparativo com exemplos simplificados entre cálculos de 06 e de 12 meses de prazo (Situações ‘A’ e ‘B’ adiante), para facilitar o entendimento e, depois, se compara com o caso concreto do contrato em debate nos autos.

Situação A:
Juros de 10% ao mês e prazo de 06 meses:
Cálculo de juros simples ou lineares: 10% x 6 meses = 60% de juros totais em 6 meses.

Cálculo pelo Sistema Price (1+ 10%)6 = (1,10)6  = 1,7715 – 1 = 0,7715 x 100 = 77,15% de juros totais nos mesmos 06 meses.

] Conclusão: pelo Sistema Price não se está pagando 10% ao mês, mas sim, na verdade, 12,85% ao mês, o que ocorre em face de a aludida Tabela já conter em sua sistemática de cálculo uma função exponencial que constitui uma progressão geométrica e gera na verdade a incidência de juros sobre juros.

Situação B:
Juros de 10% ao mês e 12 meses de prazo:
Cálculo de juros simples ou lineares: 10% x 12 meses = 120% de juros totais em 12 meses.

Cálculo pelo Sistema Price: (1 + 10%)12= (1,10)12 = 3,1384 – 1 = 2,1384 x 100 = 213,84% de juros totais em 12 meses.

] Conclusão: pelo Sistema Price não se está pagando 10% ao mês, que é taxa nominal, mas sim, na verdade, 17,82% ao mês, fato, como já referido na letra ‘A’, decorrente da função exponencial contida na fórmula da Tabela Price.

Note-se que os juros de 10% ao mês, aplicados pela Tabela Price, na realidade, são mais altos, e quanto maior o prazo, maior é a diferença entre a Tabela Price e os juros simples: 10% ao mês, em 6 meses, a juros simples ou lineares, correspondem a 60%, enquanto que, pela Tabela Price, ascendem a 77,15% (uma diferença a maior de 17,15%). Estendendo-se o prazo para 12 meses, tem-se 120% a juros simples ou lineares e 213,84% pelo Sistema Price (uma diferença a maior de 93,84%). Essa situação mostra que, na verdade, o que é relevante não é propriamente a taxa de juros contratada (10%), mas sim o prazo, pois, quanto maior o prazo, maior será a quantidade de vezes que os juros se multiplicarão por eles mesmos {(10%)6.(10%)12}, o que demonstra e configura o anatocismo como traço inerente e imanente à Tabela Price.
Logo, não é por acaso que a Tabela Price é utilizada nos contratos de aquisição de imóveis habitacionais, pois tais contratos são sempre de longo prazo, e aí é que está o ganho desmesurado das instituições financeiras e a brutal transferência de renda dos mutuários para  o sistema financeiro. Isso explica também porque os juros no crédito habitacional são sempre relativamente baixos se comparados com outros negócios bancários. Na verdade, em face do sistema de cálculo, os juros jamais são baixos como poderiam parecer ao leigo ou mesmo ao iniciado que fizesse apenas uma análise superficial, sem adentrar nos segredos do cálculo matemático.
Tendo em conta os critérios matemáticos, sucintamente demonstrados nos comparativos acima referidos, passa-se à aplicação do mesmo raciocínio para o caso concreto do contrato dos autores. Como já referido, o contrato prevê taxa nominal de 10,49% ao ano, a qual corresponde a 0,8741666% ao mês, e taxa efetiva de  juros de 11% ao ano, o que corresponde 0,9166666% ao mês. Observe-se para logo, como já referido, que quando se fala em taxa nominal, fala-se em juros simples, e quando se fala em taxa efetiva, trata-se de juros capitalizados, calculados pela fórmula exponencial segundo o tempo ou prazo. Em razão disso, para o cálculo, impõe-se que se tome a taxa nominal que é a que corresponde a juros simples. Veja-se:

Contrato: juros nominais de 10,49% ao ano com prazo de 180 meses:

Cálculo de juros simples ou lineares: 10,49% ao ano = 0,8741666% ao mês
15 anos = 180 meses
então: 10,49% x 15 anos = 157,35% de juros totais em 180 meses (15 anos).
Cálculo pelo Sistema Price: (1 + 0,8741666%)180 = (1,008741666)180 = 4,79063128 – 1 = 3,79063128 x 100 = 379,06% de juros totais em 180 meses (15 anos).

] Conclusão: os autores não estão pagando 10,49% ao ano (ou 0,8741666% ao mês), mas sim 25,270% ao ano (ou 2,10583% ao mês), além da correção monetária que é acrescida.
Assim, no caso do contrato dos autores, a taxa de 10,49% ao ano (ou 0,8741666% ao mês), até pode, aparentemente, ser considerada baixa, todavia a questão fundamental é por quantos meses, ou por quantas vezes, ela se multiplicará por ela mesma (progressão geométrica): {(0,8741666%)180}, isto é, 15 anos ou 180 meses, diferenciando-se totalmente dos juros simples, os quais serão apenas multiplicados pelos meses ou anos (10% x 6; 10% x 12; 11,39% x 15, como antes demonstrado).
Por meio das fórmulas matemáticas acima explicitadas, percebe-se a estratosférica diferença entre os cálculos e a oneração respectiva deles decorrente: 157,35% para 379,06%, isto é, adotando-se a fórmula dos juros simples o crescimento é apenas aritmético e, adotando-se a fórmula da Tabela Price, o crescimento se dá em progressão geométrica (juros capitalizados ou compostos, inerentes à fórmula da Tabela Price). Trata-se de capitalização, contagem de juros sobre juros, de juros compostos ou antacismo.
Essa realidade é comprovada pela própria palavra do Reverendo Richard Price, retirada de sua obra original, demonstrando a existência congênita de capitalização ou juros compostos no Sistema Price. O eminente autor antes referido, JOSÉ JORGE MESCHIATTI NOGUEIRA (op. cit. p. 57), para comprovar essa indiscutível realidade, vale-se da palavra do religioso inglês, transcrevendo verbum ad verbum, a seguinte passagem do original da obra de Price, apresentando, a seguir, a respectiva tradução para o português:
“One penny put out at our Saviour’s birth to five per cent. compound interest, would, in the present year 1781, have increased to a greater sum than would be contained in TWO HUNDRED MILLIONS of earths, all solid gold. But, if put out to simple interest, it would, in the same time have amounted to  no  more than SEVEM SHILLINGS AND SIX-PENCE.”

“Um centavo de libra emprestado na data de nascimento de nosso Salvador a um juro composto de cinco por cento teria, no presente ano de 1781, resultado em um montante maior do que o contido em DUZENTOS MILHÕES de Terras, todas de ouro maciço. Porém, caso ele tivesse sido emprestado a juros simples ele teria, no mesmo período, totalizado não mais do que SETE XELINS E SEIS CENTAVOS.” (Os destaques são do original).

A passagem, a despeito do exagero do Reverendo Price, dá a exata idéia da magnitude da diferença de se computar juros simples e juros capitalizados ou compostos, e demonstra, de forma definitiva, que ditas Tabelas são constituídas à base de juros capitalizados.  
Então, a primeira ilegalidade contida no cálculo pela Tabela Price é a do crescimento geométrico dos juros que configura anatocismo ou capitalização, que é legalmente proibida em nosso sistema, nos contratos de mútuo, como adiante será melhor explicitado, estando excetuados da vedação apenas os títulos regulados por lei especial, nos termos da Súmula nº 93 do STJ.
Observe-se, a seguir e como anteriormente já referido, que se abate da dívida (ou do saldo) apenas a amortização, mas não os juros, que são pagos juntamente com a amortização, embutidos em cada prestação mensal. A amortização (do saldo ou do principal) é maior ou menor segundo forem menores ou maiores os juros que compõem a parcela, com o que o saldo devedor, que serve de base para o cálculo de novos juros no mês seguinte, será maior ou menor dependendo do valor da amortização que, por sua vez depende do valor maior ou menor dos juros cobrados na parcela. Essa situação será comparada e abordada adiante. Por ora apenas se demonstra a amortização e o cálculo dos juros:
Situação C:
Dívida total inicial de..............R$ 10.000,00
Prestações mensais:
1ª) 2.296,07 (-1.000 de juros) ] - 1.296,07  de amortização
Saldo remanescente da dívida    8.703,93 (x 10% de novos juros = 870,40)

2ª) 2.296,07 (-870,40 de juros)] - 1.425,67  de amortização
Saldo remanescente da dívida       7.278,26 (x 10% de novos juros = 727,83)

3ª) 2.296,07 (-727,83 de juros) ] -1.568,24 de amortização
Saldo remanescente da dívida      5.710,02 (x 10% de novos juros = 571,00)

4ª) 2.296,07 (-571,00 de juros) ] -1.725,07  de amortização
Saldo remanescente da dívida      3.984,95 (x 10% de novos juros = 398,49)

5ª) 2.296,07 (-398,49 de juros) ] -1.897,58 de amortização
Saldo remanescente da dívida      2.087,37 (x 10% de novos juros = 208,70)

6ª) 2.296,07 (-208,70 de juros) ] -2.087,37 de amortização
Saldo remanescente da dívida            0
Agora, tomando-se os mesmos dados ‘valor financiado’ de R$ 10.000,00, ‘prazo’ de 06 meses, ‘juros’ de 10% e ‘prestação mensal’ de R$ 2.296,07, procede-se ao cálculo com juros simples. Isto porque, se a Tabela Price não tem capitalização, como normalmente se sustenta, ou se ela, por alguma forma, não é ilegal, porque não cobra valor a maior do devedor do que aquilo que é devido a juros simples, então, com os mesmos dados acima, especialmente com o mesmo valor da prestação, deve-se chegar ao mesmo resultado, sem oneração do mutuário. Todavia, ver-se-á que não é isso o que ocorre, pois, há, sim, maior oneração do mutuário.
Assim, tomando-se o mesmo exemplo acima, de amortização da Tabela Price, porém com cálculo a juros simples, partindo da mesma prestação, temos:

Situação D:
10% x 6 = 60%/100, o que corresponde a um coeficiente de: (0,6+1) = 1,6
                                                                                          Valor Financiado                                                                                                                R$ 10.000,00
            Prestações mensais:
            1ª) 2.296,07 ÷1,6                 ]                                      -1.435,04
                                                                                                     8.564,96
                               (-0,10)    
            2ª) 2.296,07 ÷ 1,5                ]                                       -1.530,71
                                                                                                      7.034,27   
                  (-0,10)     
            3ª) 2.296,07 ÷ 1,4                ]                                       -1.640,05
                                                                                                      5.394,22           
                               (-0,10)
4ª) 2.296,07  ÷1,3                ]                                       -1.766,20
                                                                                                      3.628,02
                                (-0,10)
            5ª) 2.296,07 ÷ 1,2                ]                                       -1.913,39
                                                                                                      1.714,63
                              (-0,10)     
6ª) 2.296,07 ÷ 1,1                ]                                       -2.087,33
                  Saldo positivo                ]                                          372,70
Verifica-se que, se os juros forem simples, a amortização mensal da dívida é maior desde a primeira prestação – tanto que ao final, no demonstrativo acima, o saldo é positivo (credor, e não devedor) –, com o que se verifica que a Tabela Price importa cobrança de juros maiores, pois, do contrário, a amortização da dívida seria maior, ou no mínimo idêntica à dos juros simples, e o abatimento (amortização) do saldo devedor em cada parcela seria maior e, em conseqüência, os juros da parcela seguinte seriam calculados sobre saldo menor e, por conseguinte, os juros seriam menores. Mas, na Tabela Price acontece o contrário, e o que ocorre é o efeito-capitalização.
Então, como antes referido, percebe-se que, na Tabela Price, somente a amortização é que se deduz do saldo devedor. Os juros jamais são abatidos, o que acarreta amortização menor e pagamento de juros maiores em cada prestação, calculados e cobrados sobre saldo devedor maior em decorrência da função exponencial contida na Tabela, o que configura juros compostos ou capitalizados, de modo que o saldo devedor é simples e mera conta de diferença. Além disso, tratando-se, como antes visto, de progressão geométrica, quanto mais longo for o prazo do contrato, mais elevada será a taxa e maior será a quantidade de juros que o devedor pagará ao credor. Mais oneroso, pois, será o efeito-capitalização.
Ocorre que, em tais circunstâncias, como a seguir se verá no demonstrativo matemático, tanto faz calcular os juros e não os incluir no saldo devedor e deduzir somente a amortização ou incluir os juros no saldo devedor e depois deduzir o valor total da prestação (amortização e juros), isto porque os juros já foram calculados sobre eles mesmos em função da taxa sobre taxa ou da progressão geométrica a que se referiu, o que configura a capitalização ou anatocismo.
Na Price o saldo devedor – como mera conta de diferença (e esse é, digamos assim, mais um dos ‘truques’ da Tabela) – é maior do que na incidência de juros simples, de modo que as sucessivas incidências de juros ocorrem sempre sobre um valor ou uma base maior do que no cálculo dos juros simples. E isso ocorre porque se trata de taxa sobre taxa, juros sobre juros, função exponencial, progressão geométrica, ou como se queira chamar: anatocismocapitalização, juros compostos ou contagem de juros de juros.
Enfim, seja como for, o fato é que a utilização da Tabela Price gera o efeito-capitalização.
Observa-se, claramente, que é na prestação da Price que estão embutidos ou, melhor dizendo, disfarçados, os juros compostos e onde exatamente se visualiza o anatocismo ou incidência de juros sobre juros ou taxa sobre taxa ou progressão geométrica. E isso porque, repita-se, o saldo devedor, no sistema da Price, não é propriamente o saldo devedor real, mas uma simples conta de diferença.
No exemplo acima (Situação “D”), conclui-se que, no cálculo com juros simples, sem a capitalização provocada pela função exponencial da Price, o saldo é credor, em face de uma amortização maior, já que os dados da dívida pactuada são exatamente os mesmos.
Em linguagem mais simples e numa síntese conclusiva incidental, poder-se-ia dizer que a Tabela Price não dá qualquer importância ao saldo devedor (já que aquela o considera apenas como mera conta de diferença), pois, v. g., numa prestação de R$ 1.000,00, não importa se os juros são de R$ 500,00 e a amortização da dívida de R$ 500,00; ou se os juros são de R$ 700,00 e a amortização de R$ 300,00; ou o inverso, se os juros são de R$ 300,00 e a amortização de R$ 700,00, pois não importa o saldo devedor, maior ou menor, pois é  sempre conta de diferença. Mas, em tais circunstâncias, o que ocorre é que os juros são muito superiores aos simples ou lineares; os juros pagos em cada prestação sempre são superiores porque incidem sobre um saldo devedor maior já que a amortização foi menor em benefício dos juros; se o saldo devedor não fosse mera conta de diferença, se os juros na Price não fossem capitalizados e se a amortização fosse a real, o saldo a cada parcela seria menor, e os juros – que seriam calculados em cada parcela sobre saldo menor – por simples lógica matemática, também seriam menores. Entretanto, como já referido anteriormente, na Price os juros são capitalizados por que são calculados taxa sobre taxa em razão da função exponencial, já aludida, contida na fórmula.
Veja-se agora o demonstrativo a seguir, o mesmo da Situação “C” acima, apenas mais detalhado, mostrando agora a inclusão dos juros no saldo devedor para depois abater a prestação, como mais um ‘truque matemático’ utilizado pelas instituições financeiras, que permite encobrir a ilegalidade da capitalização contida na Tabela Price. Veja-se o demonstrativo:
Dívida total inicial                                                                   R$ 10.000,00
(+) Juros mensais de 10%                                                      R$   1.000,00
(=) Saldo mais juros antes da prestação                                  R$ 11.000,00
(-) 1ª prestação mensal (juros de 1.000,00)                           R$   2.296,07   
(=) Saldo remanescente da dívida                                         R$    8.703,93
(+) Juros mensais                                                                   R$      870,40
(=) Saldo mais juros antes da prestação                                R$   9.574,33
(-) 2ª  prestação mensal (juros de 870,40)                             R$   2.296,07 
(=) Saldo remanescente da dívida                                          R$  7.278,26
(+) Juros mensais                                                                   R$     727,83
(=) Saldo mais juros antes da prestação                                R$  8.006,09
(-) 3ª prestação mensal (juros de 727,83)                              R$  2.296,07
(=) Saldo remanescente da dívida                                         R$   5.710,02
(+) Juros mensais                                                                   R$     571,00
(=) Saldo mais juros antes da prestação                                R$  6.281,02
(-) 4ª prestação mensal (juros de 571,00)                              R$  2.296,07
(=) Saldo remanescente da dívida                                         R$  3.984,95
(+) Juros mensais                                                                  R$      398,49
(=) Saldo mais juros antes da prestação                               R$   4.383,44
(-) 5ª prestação mensal (juros de 398,49)                              R$  2.296,07
(=) Saldo remanescente da dívida                                         R$  2.087,37
(+) Juros mensais                                                                  R$     208,70
(=) Saldo mais juros antes da prestação                               R$  2.296,07
(-) 6ª  prestação mensal (juros de 208,70)                            R$  2.296,07
(=) Saldo remanescente da dívida                                         R$      0
Observe-se que, neste último demonstrativo, somaram-se os juros antes do abatimento da prestação. Vê-se, como antes referido, que o sistema encobre’ a questão de que o saldo devedor é mera conta de diferença. Perceba-se que esse jogo matemático significa, na verdade, a mesma coisa que não incluir os juros no saldo devedor.
É que, como dito, é próprio da Tabela Price que, na fórmula de cálculo, não se adicione juros ao saldo devedor porque o mutuário já paga mais juros em cada prestação em prejuízo da amortização, que é menor exatamente porque os juros cobrados são maiores, superiores aos contratados, daí o ‘truque’ de o saldo devedor funcionar como conta de diferença que ‘encobre’ a cobrança abusiva por taxas superiores às contratadas e com anatocismo.
E não se adicionam os juros ao saldo devedor exatamente porque a taxa já é capitalizada, isto é, taxa sobre taxa, progressão geométrica ou juros compostos, capitalização ou anatocismo – como se queira apelidar, pois tudo é uma única e mesma realidade – por isso que permite a cobrança de juros muito superiores às taxas que são ajustadas entre as partes e postas nos contratos.
Na verdade quando se afirma que a Tabela Price não adiciona juros ao saldo devedor não se está dizendo nenhuma novidade. Todavia, isso não é o mesmo que dizer que não há cobrança de juros capitalizados ou compostos. É mais do que evidente que, se o mutuário já paga mais em função dos juros compostos, embutidos nas parcelas mensais, resulta óbvio que não pode haver o que adicionar ao saldo devedor porque o mutuário já pagou juros maiores, de modo que seria duplo abuso ou duplo anatocismo se o mutuário, além de já pagar juros sobre juros embutidos nas parcelas, tivesse ainda que ver adicionados juros ao saldo devedor, sobre o qual seria calculada a nova parcela mensal com juros calculados também sobre aqueles outros juros que teriam sido assim, antes, adicionados ao saldo devedor. Seria, portanto, o supra-sumo do abuso ou do anatocismo.
Então, quando se afirma que a Tabela Price não adiciona juros ao saldo, na verdade está se dizendo, de forma não expressa, mas implícita, que o saldo devedor é mera conta de diferença, porque são cobrados juros maiores, por taxa superior à contratada como antes demonstrado, em prejuízo da amortização do saldo devedor que, de outra forma, seria muito menor. Ora, cobrar juros maiores na prestação, em prejuízo da amortização do saldo devedor, o qual poderia ser menor se a amortização fosse maior, tem o mesmo resultado do ponto de vista da abusividade, que incluir no saldo devedor juros não cobrados na parcela, formando um novo saldo sobre o qual incidem novos juros, isto é, capitalização. A conclusão é intuitiva: não capitaliza os juros no saldo devedor porque capitaliza na prestação, em função do cálculo de taxa sobre taxa, juros sobre juros, ou simplesmente, de maneira mais técnico-matemática: em virtude da função exponencial, que gera uma progressão geométrica, contida na fórmula da Tabela Price.
Agora, observe-se, no caso concreto do contrato do demandante, a partir dos exemplos e comparações antes transcritos, o cálculo da primeira prestação do contrato, pelas duas sistemáticas referidas: a primeira com base na Tabela Price (Situação I, abaixo) e, a segunda, pelo cálculo dos juros simples (Situação II, adiante).

Situação I

Cálculo pela Tabela Price para a 1ª parcela do contrato do autor:

Dados do contrato (fl. 20):
Tabela Price.
Valor financiado: R$ 12.994,56 em 180 meses ou 15 anos.
Juros: 10,49% ao ano ou 0,8741666% ao mês.
Aplicando-se a fórmula da Price:
Lembre-se: (função exponencial = juros compostos = capitalização).

 (1 + 0,8741666%)180  x 0,8741666%  x 12.994,56 =
     (1 + 0,8741666%)180 – 1

(1 + 0,008741666)180 x 0,008741666 x 12.994,56 =
(1 + 0,008741666)180 – 1

4,79063128 x 0,008741666 x 12.994,56 =
        4,79063128 – 1

0,041878098 x 12.994,56 =
 3,79063128

0,01104778990 x 12.994,56 = R$ 143,56 ] valor da prestação

Verifica-se, portanto, que o valor encontrado mediante aplicação da fórmula da Tabela Price – de juros compostos, de progressão geométrica – coincide exatamente com a prestação apresentada pelo Banco, conforme contrato (fl. 20, item 2.3.1 do pacto).

Situação II:

Cálculo da prestação a juros simples como determina a lei e a jurisprudência, como adiante será demonstrado, tomando-se, portanto, os mesmos dados do contrato:

Para se chegar ao valor da prestação por juros simples ou lineares, segue-se o raciocínio desenvolvido por José Jorge Meschiatti Nogueira (op. cit. pp. 221/242), em que o mencionado autor apresenta a solução para a retirada do anatocismo da Tabela Price e demonstra, a partir do preceito da progressão aritmética de Carl Friederich Gauss, a fórmula respectiva para o retorno em parcelas ao credor, do capital com juros simples ou lineares.
Lembre-se que os dados do contrato são:
K = R$ 12.994,56
i = 0,8741666% ao mês ou 10,49% ao ano
n = 180
Inicialmente encontra-se o índice n-1:
n – 1 = 179
0,8741666 x 179 = 156,4758%
(1 + 156,4758%:100) + 1 = (1 + 1,564758) + 1 = 2,564758 + 1
3,564758 = 1,782379 _ ponto médio
      2

Cálculo do custo do financiamento a juros simples:

12.994,56 (0,8741666% : 100 x 180) + 12.994,56 =
12.994,56 x (1,57349988) + 12.994,56 = 33.441,49 _ custo do financiamento a juros simples, com a taxa do contrato de 10,49% ao ano.


Cálculo da prestação a juros simples:

   33.441,49      =  33.441,49R$ 104,23 _ prestação
1,782379 x 180      320,828

Observa-se que a diferença no valor da prestação inicial, comparando-se o cálculo pela Tabela Price com o cálculo por juros simples, é de R$ 39,33 (R$ 143,56 menos R$ 104,23), o que significa que a prestação é 37,73% a maior pela Tabela Price, que, como dito, adota juros compostos, taxa sobre taxa, juros sobre juros ou simplesmente capitalização, com o que onera absurdamente os mutuários.
Portanto, o valor inicial da prestação dos autores, com o expurgo da capitalização inerente e imanente à Tabela Price, é de R$ 104,23.
Esse é o valor da prestação inicial do contrato dos autores, o qual deve sofrer as correções contratuais, ao longo do tempo, como adiante será também definido.
É por todos esses fundamentos que esta colenda C. 9ª Câmara Cível não tem admitido a utilização da Tabela Price nos contratos de financiamento de imóveis, assim como também qualquer outro sistema de amortização que acarrete abusividade e onerosidade excessiva para o mutuário em benefício da instituição financeira.
Nessa linha, dentre outros, podem-se citar o seguinte precedente, do qual fui Relator, cuja ementa está assim redigida:
“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. 1. CONTRATO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO PELO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH). 2. APLICAÇÃO DO CDC. 3. POSSIBILIDADE DE REVISÃO E ALTERAÇÃO JUDICIAL DOS CONTRATOS. 4. TABELA PRICE. EXPONENCIAL DA TABELA E PROGRESSÃO GEOMÉTRICA. TAXA SOBRE TAXA, JUROS SOBRE JUROS OU ANATOCISMO. CÁLCULOS DEMONSTRATIVOS. 5. COMPARAÇÕES E DIFERENÇAS ENTRE O CÁLCULO POR JUROS SIMPLES OU LINEARES, O CALCULO PELA TABELA PRICE (CAPITALIZAÇÃO MENSAL) E O CÁLCULO SEM UTILIZAÇAO DA TABELA PRICE. DEMONSTRAÇÃO DE QUE A TABELA PRICE CAPITALIZA OS JUROS MENSALMENTE. ILEGALIDADE DA APLICAÇÃO DA TABELA PRICE. 6. CAPITALIZAÇÃO VEDADA EM QUALQUER PERIODICIDADE. 7. OBSERVÂNCIA DO LIMITE CONTRATUAL DE 30% DO COMPROMETIMENTO DA RENDA FAMILIAR. 1. O Contrato de financiamento celebrado com fundamento na Lei n° 4.380/64, é regido pelo arcabouço de normas do SFH. 2. O CDC incide sobre os chamados contratos bancários. Precedentes do STJ. 3. A revisão dos contratos, em face do CDC, é possível pelo simples fato do desequilíbrio contratual na sua execução, independentemente da validade ou não do ajuste na sua formação. Aplicação do Princípio do Equilíbrio Contratual. 4. Aplicação da Tabela Price. Neste sistema os juros crescem em progressão geométrica e não em progressão aritmética, caracterizando juros sobre juros ou anatocismo. E na prestação da Price que estão "disfarçados" os juros compostos, porque não são incluídos e nem abatidos do saldo devedor, mas sim, compôem, ditos juros compostos, a prestação, em virtude da função exponencial contida na fórmula do Sistema Price. Em tais circunstâncias, o mutuário paga mais juros em cada prestação, em prejuízo da amortização do débito, de modo que o saldo devedor - dado de extrema relevância para o financiado ou mutuário - no sistema da Tabela Price não tem qualquer relevância e serve 'apenas' como 'conta de diferença', em prejuízo do mutuário. Assim, no sistema Price, o saldo devedor não é propriamente o saldo devedor 'real', mas se configura tão-somente como simples e mera conta de diferença. Dizer que não se adicionam juros ao saldo devedor, não é o mesmo que dizer que não se cobram juros compostos ou capitalizados. E evidente que, se o mutuário já paga mais em função dos juros compostos incluidos nas parcelas mensais, resulta óbvio que não pode haver adição de juros ao saldo devedor, queR porque o mutuário já pagou juros maiores na parcela, quEr porque seria duplo abuso ou duplo anatocismo, o qual restaria induvidosamente configurado se o mutuârio, além de já pagar juros sobre juros nas parcelas, tivesse ainda que ver adicionados mais juros ao saldo devedor, sobre o qual seriam calculados novos juros que comporiam as seguintes e sucessivas parcelas, as quais, por sua vez, em face da sistemática da Price, possuem também juros embutidos, que, por evidente, seriam calculados sobre os juros que teriam sido, assim, antes, adicionados ao saldo devedor. Seria, portanto, o supra-sumo do abuso ou do anatocisrno. Quando se afirma que a Tabela Price não adiciona juros ao saldo, na verdade está-se dizendo, de forma não expressa, mas implícita, que o saldo devedor será mera conta de diferença, porque serão cobrados juros maiores, em progressão geométrica pela função exponencial da Price, acarretando cobrança por taxa superior à contratada, em prejuízo da amortização do saldo devedor, que, de outra forma, seria muito menor Ora, cobrar juros maiores na prestação, em prejuizo da amortização do saldo devedor, o qual poderia ser menor se a amortização fosse maior, tem o mesmo resultado, do ponto de vista da abusividade, que incluir no saldo devedor juros não cobrados na parcela, formando um novo saldo sobre o qual incidem novos juros. A conclusão é intuitiva: não capitaliza os juros no saldo devedor porque capitaliza na prestaçâo, em função do cálculo de taxa sobre taxa, juros sobre juros, ou simplesmente, de maneira mais técnico-matemática: em virtude da função exponencial, que caracteriza progressão geométrica, contida na fórmula da Tabela Price. 5. O custo total do financiamento não é a simples soma das parcelas mensais do prazo do contrato, ou a mera multiplicação do valor da parcela inicial pelo número de parcelas do prazo pactuado. Isto porque, após o pagamento de cada parcela, é como se o credor fizesse a reaplicação ou nova aplicação do saldo devedor em relação ao mutuário, de modo que, quando mais longo for o prazo do contrato, maior é o ganho em juros de juros ou juros capitalizados. Esse efeito só é matematicamente percebido quando apurada a incidência do juro retornado de maneira inversamente proporcional ao prazo transcorrido, sobre cada parcela que representa a fração de devolução no tempo do capital emprestado. Doutrina de José Jorge Meschiatti Nogueira, na obra Tabela Price - Da Prova Documental e Precisa Elucidação do seu Anatocismo, Ed. Servanda, 2002. Cálculos demonstrativos e comparativos de juros com capitalização mensal, de juros pela Tabela Price e de juros lineares, sem capitalização e sem aplicação da Tabela referida. 6. A capitalização é vedada nos contratos do sistema financeiro da habitação, sendo que somente é admitida nos títulos de crédito regulados por lei especial. As prestações devem ser calculadas sem aplicação da Tabela Price e sem a capitalização dos juros. 7. Adequação da prestação à renda familiar em respeito a limitador contratual. Apelo provido.”
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 70005396783, NONA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: DES. ADÃO SÉRGIO DO NASCIMENTO CASSIANO, JULGADO EM 01/10/2003).

Em semelhante direção também é a jurisprudência do C. STJ, que tem vedado a utilização de sistemas de amortização em que o modo de calcular as prestações engendre o chamado efeito-captitalização, como ocorre nos casos de aplicação da Tabela Price como aqui longamente demonstrado. Vejam-se os precedentes daquela C. Corte Superior:
“CASA PRÓPRIA. Capitalização. É indevida a capitalização mensal de juros, que elevaria a taxa anual para além dos 10% permitidos. Recurso conhecido em parte e provido.”
(RESP 467439/RS, STJ, 4ª T., Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. em 01/04/2003, unânime, DJU de 28/04/2003, p. 206).

“SFH. Juros. Capitalização. A capitalização dos juros é proibida (Súmula 121/STJ), somente aceitável quando expressamente  permitida em lei (Súmula 93/STJ), o que não acontece no SFH.  Admitido no acórdão que o modo de calcular a prestação implica “efeito-capitalização”, o procedimento deve ser revisto para excluir-se a capitalização, proibida pelo seu efeito. Recurso conhecido e provido.”
(RESP 446916/RS, STJ, 4ª T., Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. em 01/04/2003, unânime, DJU de 28/04/2003, p. 205).

Em seu voto, neste último precedente, o ínclito Relator, Min. Ruy Rosado de Aguiar, cuja aposentadoria abriu insuperável lacuna no Judiciário brasileiro, assim deixou assentado, referindo que a forma de cálculo não pode engendrar capitalização:
“(...) Posta nessas bases a controvérsia, tendo a  própria CEF afirmado, em suas contra-razões, que inexiste capitalização no SFH (fl. 151), e ficando reconhecido no r. acórdão que há “um efeito-capitalização” no modo pelo qual está sendo calculado o valor do débito, tenho que a solução encontrada, ao admitir esse efeito, ofende o enunciado que veda a capitalização dos juros (Súmula 121⁄STF). A capitalização é proibida pelo seu efeito, e toda  modalidade de cobrança de juros que implique esse efeito é capitalização, pouco importando o nome que se atribua à operação, ou o modo como é feito o cálculo. Fazer incidir a taxa de juros sobre juros anteriormente calculados e embutidos na base de cálculo é procedimento que eleva o valor da prestação, daí que não pode ser aceito.
Admitido pela r. instância ordinária que o efeito do “mecanismo de amortização mensal de juros, embutidos no valor de amortização do capital gera efeito idêntico ao da capitalização”, é de se conhecer do recurso, pela divergência com a Súmula 121, e  dar-lhe provimento a fim de que sejam reelaborados os cálculos, sem esse “efeito-capitalização.”
A regra do art. 6º da Lei 4.380⁄64, mencionada em precedente citado no r. acórdão, não autoriza a capitalização dos juros, nem está o anatocismo permitido em nenhuma das leis indicadas e transcritas nos autos pela CEF.”

Portanto, procede a irresignação do autor relativa à capitalização, devendo ser adotado sistema de amortização que não implique capitalização e oportunize a incidência e cobrança de juros simples ou lineares, como antes demonstrado, com a recomposição dos valores devidos.
Observo que não houve pedido de repetição de indébito em relação aos valores pagos indevidamente, razão pela qual nada há a prover nesse ponto.
Assim, merece provimento a irresignação do autor para que a taxa de juros a ser adotada seja a de 10,49% que é nominal, e não a de 11% que, embora esteja abaixo do limite legal de 12%, é taxa efetiva e por isso capitalizada.
Portanto, a capitalização deve ser excluída, nos termos acima explicitados.