21 de agosto de 2008

TJRS declara ilegal cobrança de ponto extra de tevê a cabo

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Veja o Inteiro teor do Acórdão:

DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO.
DECLARATÓRIA. COBRANÇA DE ‘PONTO EXTRA’ POR OPERADORA DE TV A CABO. DESCABIMENTO.
Ilegalidade da cobrança. Ausência de serviço efetivamente prestado a ensejar a cobrança de contraprestação pecuniária.
Procedência da demanda.
Apelo PROVIDO.


APELAÇÃO CÍVEL
DÉCIMA NONA CÂMARA CÍVEL
Nº 70020625026
COMARCA DE PORTO ALEGRE
MARIA CAROLINA BORGES CASTILHOS
APELANTE
NET SUL TV COMUNICACOES LTDA
APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. GUINTHER SPODE E DESA. MYLENE MARIA MICHEL.

Porto Alegre, 19 de agosto de 2008.


DES. JOSÉ FRANCISCO PELLEGRINI,
Relator.


RELATÓRIO

DES. JOSÉ FRANCISCO PELLEGRINI (RELATOR)
Por primeiro, adota-se o relatório das fls. 294/295:

“MARIA CAROLINA BORGES CASTILHOS ajuizou Ação ordinária com pedido Liminar contra NET SUL – TV A CABO E PARTICIPAÇÕES LTDA. Alegou, em suma, ter firmado com a requerida contrato de inscrição no sistema de TV por assinatura, através do qual, a ré disponibiliza os serviços de TV a cabo, que consiste na distribuição de sinais de vídeo e/ou áudio em sua residência, mediante pagamento mensal. Entretanto considera ilegal, arbitrária e abusiva a cobrança de tarifa por cada ponto adicional.
Diante disso, provocou o Poder Judiciário para ver atendidos os pedidos: de determinação para que a ré abstenha-se de cobrar os valores a título de ponto extra; declaração de abusividade da cobrança de ponto extra e a condenação da requerida a restituição em dobro das quantias pagas; além da condenação às custas processuais e honorários advocatícios e a concessão do benefício de assistência judiciária gratuita.
Juntou documentos (fls. 16/45).
Concedido o benefício de Assistência Judiciária Gratuita à autora (fls. 46).
Citada, a ré contestou (49/71) e juntou documentos (72/244). Argüir preliminarmente a prescrição da pretensão da autora quanto ao período anterior à 26 de maio de 2003. No mérito sustentou a natureza privada do seu serviço, defendeu o ponto extra como serviço oneroso e a existência de previsão contratual do referido ponto extra. Diante disso, requereu o acolhimento da preliminar para declarar prescrita da pretensão do direito à restituição das parcelas pagas antes de 26 de maio de 2003 do ponto adicional e no mérito a total improcedência da demanda.
Houve réplica (fls. 246/250).
Intimadas as partes, para manifestarem-se sobre demais provas a produzir (fl. 251), a parte autora juntou documento (fls. 254/257) e a ré requereu o julgamento antecipado da lide com fulcro no art. 333, I do CPC além de ter juntado documentos (fls. 253/210).”

A sentença julgou improcedente o pedido.

Sucumbente, a parte autora foi condenada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, forte no artigo 20, § 3º, do CPC. Suspensa, contudo, a sua exigibilidade em virtude da concessão da gratuidade da justiça.

Inconformada, a demandante apelou. Alegou que inexiste previsão legal para a cobrança do ponto adicional do serviço de TV a cabo. Aduziu que o artigo 26 da Lei nº 8.977/95 apenas contempla a possibilidade da cobrança da taxa de adesão e da remuneração pela disponibilidade do sinal na residência do contratante. Discorre que, além de ilegal e arbitrária, a cobrança do ponto adicional é abusiva, tendo em vista que inexiste efetiva realização de serviço. Sustentou, assim, que, com a entrega do sinal na casa do consumidor, a finalidade do serviço está satisfeita, de modo que a existência de ponto extra não configura qualquer serviço adicional prestado.

Houve contra-razões.

Subiram os autos.

É o relatório.

VOTOS

DES. JOSÉ FRANCISCO PELLEGRINI (RELATOR)

Dá-se provimento ao apelo.

A autora contratou junto à ré, no ano de 2000, o fornecimento de serviço de ‘TV A CABO’, modalidade de emissão/recepção de sinal fechado de programação televisiva que disponibiliza grade diferenciada em relação à emissão por sinal aberto. Desejou, ademais do ponto principal, a instalação de ponto adicional (dois pontos, mais exatamente), cuja cobrança de tarifa vem, pela presente demanda, profligar.

Vinga a declaratória, vez que não há nova prestação de serviços pelos quais a operadora possa exigir contraprestação pecuniária mensal.

Não há novo serviço passível de cobrança porque o cabo por onde é fornecido o sinal já se encontra instalado para levá-lo até o aparelho televisor, no apartamento da consumidora.
O sinal, portanto, já possui entrada para o interior da residência da autora; o canal para isso preexiste ao pretendido ponto adicional.

Não são necessárias novas instalações desde a rede externa, ou desde o logradouro público até o prédio, ou mesmo desde a entrada do prédio até a unidade autônoma (apartamento) da cliente.
Inexiste, pois, exigência de nova instalação física para disponibilizar o sinal – este já está acessível dentro da residência da parte autora.

Logo, não há custos porquanto a estrutura física encontra-se previamente disponível.

Verifica-se, outrossim, que o sinal é digital, não analógico. Por corolário não se cogita de custos extras para o seu fracionamento. Um mesmo cabo veicula incontáveis sinais para mais de um terminal, para mais de um televisor. Não é preciso atualização de equipamento ou maquinário, pela ré, visto que é da natureza da informação digital sua armazenabilidade em diminuto espaço, sendo possível transmitir mais informação através de sistemas digitais do que em sistemas analógicos.

Mesmo a manutenção é menos freqüente, em relação ao serviço prestado, já que sinais digitais são muito menos sensíveis a interferências ou ruídos.

Eventualmente, poderá ser necessária a instalação de nova fiação – à moda de extensão telefônica -, tudo internamente à moradia da autora; porém, cobra-se esta instalação pontual, que será feita uma única vez. Certo que isto não pode ensejar a cobrança de uma tarifa mensal.
Do terminal, que fará jus a um novo equipamento decodificador, somente poder-se-á cobrar o custo específico desse decoder. Por isso, não haverá custos extras, para as operadores, porquanto num único momento será cobrada a instalação, quando necessária, e o equipamento, objeto de venda (e não objeto de comodato ou locação, que poderia mascarar alguma taxa periódica), será devidamente pago, na íntegra, pelo adquirente.

Ou seja, cobra-se o preço do equipamento físico fornecido, se necessário for, à consumidora. Trata-se de fornecimento (venda) DE PRODUTO e não de serviço – pois que, como se viu, não há novos custos, razão pela qual não se fala em nova mensalidade.

Obviamente, futura necessidade de reparos específicos motivados pela necessidade da consumidora serão pagos, com a análise caso a caso do problema apresentado. Não há margem para qualquer taxa periódica referente a manutenção (em tese preventiva), a propósito.
Veja-se que, por se ter assinante antigo, já há cadastro com a respectiva identificação. Já há, no mais das vezes, uma relação continuada de conhecimento e confiança entre cliente e operadora, inclusive, inexistindo, reprise-se, sequer a necessidade de novo cadastramento.

No geral, não há prova robusta de custos extras derivados do ponto adicional, e à operadora cumpria os demonstrar. Na ausência de comprovação dos custos, investimentos ou perdas que poderiam advir da instalação do ponto adicional, para as operadoras, a cobrança de tarifa ou preço periódicos afigura-se excessiva, abusiva à luz do CDC, 51, inc. IV e XV e parágrafo 1º, I e III.

Quer a apelada que se presuma a onerosidade da prestação de um serviço que, digital, já tem a sua rede física básica subjacente pré-disponibilizada. Não pode vicejar tal pretensão.
Note-se que a Resolução 488/07 da ANATEL já indicava a proibição de cobrança nesse sentido, refletindo o sentimento público em geral, e o bom senso, aliás.

Neste contexto, dá-se provimento ao apelo, acolhida a pretensão inaugural. Sucumbência invertida.

É o voto.


DES. GUINTHER SPODE (REVISOR) - De acordo.

DESA. MYLENE MARIA MICHEL - De acordo.

DES. JOSÉ FRANCISCO PELLEGRINI - Presidente - Apelação Cível nº 70020625026, Comarca de Porto Alegre: "DERAM PROVIMENTO AO APELO. UNANIME."


Julgador(a) de 1º Grau: FLAVIO MENDES RABELLO/rf